quinta-feira, 3 de maio de 2012

A espetacular história do fuzil de um tiro só: a arma que abateu a luz vermelha do Banhadão da Catuaba


A ação da milicaiada era destaque na capa daquele jornal semanal que circulava em 1966. “Exército fecha antro da imoralidade em Marmeleiro”, dizia a manchete em letras garrafais, bem no centro da página. A notícia dava conta da repressão feita cinco dias antes à Geni Drynks, famosa casa de prostituição e divertimento que funcionava no conhecido “Banhadão da Catuaba”, na saída pra Beltrão.

Lembre o caro leitor que esta era época em que estava em execução a famosa “política de desenvolvimento, cacete e cadeia”, adotada pela dita-cuja. A notícia mais era um factoide para reforçar a imagem institucional das Forças Armadas e mascarar as reais motivações dos eventos.

O caso noticiado não foi violento, segundo a versão oficial. De acordo com a redação, apenas um tiro foi disparado nessa ação. A bala saiu do mesmo fuzil que recentemente foi roubado por dois peleguinho-oreia-seca de dentro do quartel.

Após anos de silêncio – e sensibilizado pela ação militar que hoje acontece nas ruas de capital do Sertão – um dos combatentes do episódio resolveu abrir a boca e expor sua versão do fato. Ao custo de três doses de Bitter Águia, o véio do maior bigode da região, que pediu anonimato, revelou que a milicaiada era tudo amiga do putedo do banhadão; e duma amizade por demais liberal, diga-se de passagem.

Diz que a repressão foi arquitetada pelo tenente Curió, comandante do quartel. Esse mesmo Curió, um dos únicos brasileiros da época a ter as partes íntimas com uma tonalidade lilás, era frequentador de ocasião da Geni Drynks, tendo, inclusive, preferência no uso do Gabinete, local reservado à gente do alto escalão da sociedade.  

Numa noite festiva em que o Gabinete reunia as mais altas patentes militares, cargos públicos e ordenações sacerdotais, o putedo extorquiu pareio. Rameira de longa data e a esta altura aposentada do ofício de meretriz, Geni só tinha por amante oficial o dito Curió. Ela era a fonte que o passarinho bebia e se banhava e fazia o escambau. Mas essa gringa de pequenos olhos e rechonchudas curvas era esperta pros negócios. O abuso nos preços das meninas, bebidas e quarto era prática comum nestes locais.

Comandante Curió, por exemplo, torrou o dinheiro que tinha e o que estava por vir ostentando as estrelas de sua farda. Não tendo mais o que gastar, empenhorou seu Boulevard Swiss, relógio militar muito usado na época e pelo qual o comandante tinha grande apreço. A joia era presente de noivado do sogro, um major reformado.

Dias depois, o tenente viu o relógio no pulso de um empresário seu amigo. Espiculou como quem não quer nada e confirmou que o arigó havia ganhado o objeto de uma de suas “namoradas” da zona. Ao invés de dar uma camassada de pau no cara, Curió preferiu ir à fonte: reuniu todo seu contingente verde-oliva em três jipes e dois Fordinho e se bandiaram pra Marmeleiro pela estrada velha do São Cristovão.

Aqueles eram tempos em que a negada se cagava de medo diante de qualquer movimentação militar. Essa não era diferente. Ao invés da estrela, o inimigo de agora era identificado pela luz vermelha. Sob os urros do tente Curió, a milicaiama já chegou descendo o guatambu no lombo da muierada e o pau comeu pareio naquele início de noite.

Era puta arrastada pelas gadeia, colchão pegando fogo, garrafa quebrada.... e nesse rebuliço todo, apenas um tiro foi ouvido. Foi o de um fuzil empunhado por um miliquinho de metro e meio que gritava que nem um loco “cacete e cadeia nesse putedo”. O alvo do tiro não pôde ser outro senão a luz vermelha que alumiava a frente do promíscuo estabelecimento e o identificava como tal.

A cafetona Geni foi a última a se render. E só o fez depois que acorrentaram os sepos que seguravam a casa na rabeira dum caminhãozinho e puxaram, levando abaixo o meretrício mais famoso da região. Apesar da boa repercussão na imprensa, a repressão não foi bem aceita nas rodas de chimarrão, mesas de bodega e, principalmente, gabinetes. O governo militar há pouco instaurado enfrentou assim sua primeira grande crise política em razão da operação planejada apenas emotivamente por um militar com nome de passarinho.

Tenente Curió foi transferido. Perdeu o relógio, manteve a honra e ganhou a patente de major, quando liderou outra repressão, esta aos comunistas do Araguaia. Geni casou com o carcereiro da delegacia onde ficou presa por duas semanas; suas meninas, menos que isso. Já o fuzil continuou servindo a pátria, mas apenas cumprindo formalidades e intimidando por si só. Nunca mais espirrou pórva pelo cano. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário