domingo, 21 de agosto de 2011

Contos do Rio Ligeiro beirando o c* do mundo - Badanha Senior e a chacina dos Negos Buraios



1947: O rio, sua velocidade descomunal, suas enchentes contínuas e desastrosas numa terra-sem-lei, palco da convivência de gringos e caboclos, desavenças, vinganças eram comuns no dia-a-dia do lugar chamado de "c* do mundo". (inspirado em relatos históricos)

Entre os afluentes do rio Chopim estava o Rio Ligeiro, acostumado a inundar com velocidade Villa Nova (atual Pato Branco), foi assim batizado ou melhor apelidado pelo “Ligeiro”, um paraguaio que ficava na encosta do rio fazendo briques (trocas) com qualquer pelego ou dinheirudo que ali passasse, sua moeda de troca era a erva-mate, vivia na corrida pra trocar tudo pela chamada “erva do diabo” - combustível potencializante e um afrodisíaco natural do sertão.

Logo ao lado da casa e do escritório improvisado do Ligeiro havia uma raia de cavalos onde a machaiada de Villa Nova se reunia numa raia pra ver os cavalos emparelharem enquanto já rolava uma aposta e a pinga ia comendo solta. Enquanto o martelinho (copo vazio de pinga) batia o balcão improvisado, os homens pegavam o chinaredo (mulherada) pra dançar. Mas ali não era apenas ambiente de confraternização, entre apostas rolando, copos vazios e mulheres faltando o tiro comia solto também. Lembro de uma prosa que rolava entre Mané Figurinha que se dizia o maior dono de terras da costa do Chopim, o “home véio” morava no Morro do Sovaco, esse morro que pra descer todo mundo acabava fedendo sovaco de cansado, então imagine o estado do peão.

Junto dele estava Badanha Senior, botas brancas, ficava inconfundível ainda mais fumando cachimbo – seu apelido mais tarde se tornou “Sócio da Souza Cruz”. Figura era sossegado, só pensava em trabalhar, só que era mentiroso e exagerado. Badanha era “bão de desaforo”, tanto que enquanto pagava um vermute com gelo pra duas chinas teve que mexer com seis caboclos do Buraio – lugar onde se produzia carvão no antigo Bairro Godoy, atual Vila Verde -, estavam no fudunço do lado da cancha de bocha tomando um gasosão:

-Oh pé sujo! Vá 'trabaiá' mais 27 ano pra comprar um bota dessa – bradou Badanha Senior.

-Home, pareee loco véio, os piá tão de boa ali – exclamou Figura.


Entre todos, praticamente azuis de tão sujos de carvão, cochichou o menor de todos e mais coceira, Fidelzito, o revolucionário, o crítico, o “inticão”, na chamada “quebrada” onde morava, anos depois representou a “banca” e venceu o inter-bairros de coceira, só coçava mesmo:

-Vamo bochá, vamo bochá?


O caboclo Viriato logo ironizou, retrucando com voz alta:

-'Vamo' se fincar mais pro lado que tá ali duas almofada com perfume de sovaco escorando as puta no barranco – só que falou só pra acender o estopim, ia fazendo exatamente o contrário, chegando mais perto dos dois com sua trupe esfumaçada.


Entre eles estava Nego Tiguera, só acompanhando o bando, um caboclo assustado que procedente do Contestado. Tiguera não gostava de briga, nenhum pouco. Além dele, os cinco queriam ferver o ki-suco, erguer o 'reio' naqueles gringos chamados de “boca aberta”.


-Oh 'rapaiz', vai pra lá que 'nóis tamo' proseando aqui home véio, tá sujando meus garrão com esses pé – Bagé falou pra Nego Wardo, o maior de todos, um caboclo virado em cicatrizes e em marcas de gado pelo corpo, caolho e com a garrafa vazia da gasosa entre os dedos suada e prontinha pra ser decepada nos 'corno' do gringo inticão.

-Comé que é, gringo cara de bagre? - Questionou Nego Juca que foi logo peitando Badanha enquanto era interrompido por Figurinha:

-Bá home, tome um gole do meu gole e fique com a minha 'muié'.

-Sai fora com essa fonte de 'gonorréiagem', não achei meu pinto no chiqueiro pra comer putedo! - exclamou Nego Lázaro.


Enquanto isso, Fidelzito apareceu com uma faca enferrujada e sem cabo, roubada de sua mãe que a usava para sangrar os porcos-do-mato que caçava à unha nos matos do atual Vila Verde. O pequeno coceira foi logo fincando no pulmãozão de Badanha que logo caiu sangrando. Foi aí que o tiro correu solto a partir da cancha de bocha enquanto gringos racistas xingavam os buraios de "negada do diabo".

Nego Tiguera sobreviveu pois se fincou dentro de um buraco de tatu pra fugir do degladeio, a chacina dos buraios não passaria por inquérito porque a pequena vila não possuía polícia. Apareceu o pirata do Chopim, Polaco Sukita, cabeludo e de óculos escuros, jogando os corpos dentro de um barquinho caíco proseava com o chefão Badanha e dizendo-lhe um conselho:

-A lei tá boa, não vai dar cadeia!


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